Nesta quarta-feira, 15 de
novembro, celebra-se os 128 anos de proclamação da República. O
secretário-geral da CNBB, dom Leonardo Steiner, concedeu entrevista à equipe de
assessoria de imprensa sobre o significado da data.
A República Brasileira foi proclamada como resultado de um
levante político-militar que deu ao Brasil a forma republicana federativa
presidencialista do governo no Brasil, derrubando a monarquia constitucional
parlamentarista do Império do Brasil e, por causa disso, colocou um final no
comando político do imperador D. Pedro II.
Confira
entrevista.
Celebra-se
o dia da Proclamação da República em meio a uma grave crise geral no Brasil. Na
opinião do senhor, em que pé está a prática republicana no Brasil?
Nossa
compreensão sobre a República é tirada do mundo dos gregos antigos e tem
significado muito simples e acessível a qualquer pessoa que queira fazer uma
séria reflexão sobre a vida pública no Brasil: é republicano tudo o que
favorece o bem comum e não a interesses de grupos ou de pessoas. A palavra
republica diz: res-publica, a coisa pública, o
que é da responsabilidade de todos, o que está a serviço de todos. Percebemos
que valores do público, do comum como a ética, foram deixados de lado. Os
antigos diziam que governar é a maior de todas as artes. Maior porque está no
cuidado de todos e de tudo e não de grupos ou do mercado. Nesse sentido temos
uma responsabilidade com a res-publica. Percebemos como a
crise é do descuidado para com a República.
Nesse
sentido podemos lembrar o Beato Paulo VI, que na Encíclica Populorum
Progressio, publicada há cinquenta anos, recordava o propósito
inspirador de formas de governo: “Trata-se de construir um mundo em que todos os
homens, sem exceção de raça, religião ou nacionalidade, possam viver uma vida
plenamente humana, livre de servidões que lhe vêm dos homens e de uma natureza
mal domada; um mundo em que a liberdade não seja uma palavra vã”. A
prática republicana, se quisermos nos expressar assim, necessita dessas
características fundamentais para permanentemente dinamizar e maturar a
República. República não é algo pronto, exige a participação e cuidado dos
cidadãos em cada época. Teríamos, então a República como como expressão viva
das pessoas livres que são ouvidas, representadas e respeitadas, isto é,
democraticamente ativas.
Em
comentários de domínio público entre personagens da política que passaram por
situações suspeitas existe a presença da expressão de que a conversa entre eles
foi “republicana”. Para o senhor, o que é um diálogo republicano?
É republicano um diálogo que respeite, com rigor, os princípios
da honestidade, da ética pública e da fidelidade aos interesses da sociedade.
Um diálogo profundamente marcado pela integridade pessoal e pela disposição em
buscar soluções para os problemas postos na lida correta da política. Não é
republicana nenhuma conversa que trate de vantagens pessoais ou para grupos
familiares ou partidários em relação ao trato do dinheiro do contribuinte, ou
seja, o que costumam chamar de recurso público. Quando o diálogo republicano dá
lugar aos acordos para garantir interesses que não sejam aqueles defendidos
pelo conjunto da população, estabelece-se a corrupção seja ela econômica ou
moral. Quando pessoas ou grupos se permitem o direito de intervir em instâncias
do poder público para retirar delas qualquer tipo de vantagem está aberto o
caminho da corrupção ativa e passiva e ganha protagonismo corruptores e os
corrompidos.
Papa
Francisco falou sobre corrupção a parlamentares italianos que se mobilizam
contra a máfia afirmando que ela tem uma natureza contagiosa e parasitária,
porque não se nutre do que de bom produz, mas do que subtrai e rouba. O que o
senhor pensa ser possível aplicar dessa palavra do Papa na situação vivida
atualmente na república brasileira?
Papa Francisco falava de uma circunstância bem precisa dentro do
universo da república italiana e não se pode, pura e simplesmente, aplicar a
situações diferentes, mas é claro que suas palavras têm um alcance maior por se
tratar de um fenômeno que, infelizmente, se encontra em muitos países do mundo.
Quando ele fala da natureza contagiosa da corrupção, por
exemplo, pode-se notar que é um fato que se verifica na realidade brasileira.
Na verdade, o sistema político brasileiro está contaminado pela corrupção. E
isso transcende o tempo republicano para alcança os primórdios da nossa
sociedade. Uma pena é que essa contaminação atravessou os séculos e insiste em
ir dominando governos, legislaturas e tantas outras instâncias de poder
retirando do povo brasileiro seus recursos mais essenciais. A corrupção no
Brasil, como diz o Papa, também tem seu caráter parasitário porque se alimenta
do que os corruptos roubam do povo. Desse modo, a corrupção humilha o povo
brasileiro que precisa de habitação, alimentação, saúde, segurança e educação.
A
corrupção solapa tudo o que de possível poderia ser realizado com os recursos
que saem do bolso do povo, especialmente do povo mais pobre. Já passou da hora
de deixarmo-nos atrair pela ética e debater as raízes da corrupção para ser
enfrentada no nosso país. A CNBB tem insistido em seus pronunciamentos oficiais
em três caminhos para cuidar da res-publica e,
por isso, enfrentar a corrupção generalizada: o resgate da ética para garantir
lisura no modo de lidar com os valores religiosos e morais, como também com os
recursos que são do povo e devem ser aplicados em serviços para a população;
uma reforma política abrangente que envolva as eleições, o dinâmica democrática
da Legislativo, Executivo e Judiciário; a participação da sociedade inteira nos
debates e nas decisões sobre os principais temas nacionais.
Nesse momento de crise, no entanto, percebemos um movimento
quase silencioso de diversos grupos na sociedade que busca debater e refletir o
momento da nossa República. São pessoas que percebem a natureza “contagiosa e
parasitária” da corrupção nos diversos âmbitos da sociedade e assumem a
responsabilidade como cidadãos de buscar caminhos para a Republica. Se debate e
reflete a ética, a democracia, a economia, a educação, a segurança, a saúde.
Acontece diálogo! São pessoas que fazem da crise uma possibilidade de maturação
da República, guiadas pela esperança. Desejo que esse movimento cresça, se
fortaleça e como afluentes caminhem para um grande rio que é a vida à República
do Brasil. Que esse movimento atinja nossas universidades e as pequenas
comunidades do nosso interior.
FONTE: CNBB
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