domingo, 9 de setembro de 2018

EDITORIAL: POR UMA ÉTICA "AMIGA DA PESSOA"


Ver a humanidade como uma grande família, é a primeira maneira para ser inclusivos. E ter esta consciência de uma origem comum, é o motor para uma mudança nos comportamentos e estilos também no campo econômico, que deveria colocar o homem e a família no centro, e não o "ídolo dinheiro" e a busca desenfreada pelo lucro, disse o Papa em entrevista a um jornal italiano.
Jackson Erpen – Cidade do Vaticano
Falta a consciência de uma origem comum, de uma pertença a uma raiz comum de humanidade e de um futuro a ser construído juntos. Esta consciência de base permitiria o desenvolvimento de novas convicções, novos comportamentos e estilos de vida.
Na longa entrevista publicada na sexta-feira pelo jornal italiano “Sole 24 ore”, especializado em temas econômicos, o Papa Francisco falou de solidariedade, trabalho, finanças, defendendo a necessidade de uma “ética amiga da pessoa”,  capaz de sentir compaixão diante do grito de dor dos outros, de derramar lágrimas diante dos dramas que consomem a vida de nossos irmãos e também de assumir o cuidado deles.
A raiz desta “ética amiga” que defende Francisco está justamente na consciência de uma origem comum, em ver a humanidade como uma única família onde o crescimento é verdadeiro porque sustentado por relações de ajuda recíproca, ternura e misericórdia e não por devaneios de sucessos e pela exclusão de quem vive ao lado.
O Papa tem a peito os grandes sofrimentos pelos quais passa a humanidade. Muitos deles, são consequência de um sistema econômico que descarta, que não é mais capaz de gerar trabalho, porque colocou no centro um ídolo chamado “dinheiro”, obedecendo somente a ele. E uma economia assim estruturada mata, pois ganhar dinheiro torna-se o objetivo primário e único, excluindo a pessoa do centro. Assim, deixa de ser ética e constrói estruturas de pobreza, escravidão e descarte.
E não é o dinheiro que confere dignidade ao homem, sublinha o Papa, mas o trabalho. Aqueles que pensam que é o dinheiro que gera dinheiro se equivocam, pois é o trabalho que gera as riquezas concretas.
Portanto, uma economia nunca está desligada do significado daquilo que produz e o agir econômico é sempre ético. Assim, a atividade econômica, não diz respeito somente ao lucro, mas compreende também relações e significados. Por isso, visar somente o lucro, não garante a sobrevivência de uma empresa, que deve ter um significado mais amplo, ou seja, devem caminhar unidas ações e responsabilidades, justiça e lucro, produção de riqueza e sua redistribuição, operacionalidade e respeito pelo ambiente. Respeitando a dignidade das pessoas e buscando o bem comum, faz bem a uma empresa. O que não é mais possível – sustenta o Pontífice – é que os operadores econômicos não ouçam o clamor dos pobres. Por detrás de cada atividade, existe uma pessoa que toma decisões e faz escolhas.
Digno de nota, que já a Encíclica Populorum progressio do Beato Paulo VI ressaltava que o desenvolvimento não pode ser reduzido ao simples crescimento econômico, mas para ser autêntico, deve ser integral, ou seja, voltado também à promoção humana. Não é possível separar o econômico do homem, o desenvolvimento da civilização em que está inserido.
Os empresários e as empresas, assim, podem dar uma grande contribuição para que o trabalho conserve a sua dignidade, reconhecendo que o homem é o recurso mais importante de cada empresa, mas também trabalhando pelo bem comum, tendo atenção aos pobres.
Muitas já investem na formação técnica, mas Francisco sugere que a esta poderia ser acrescentada uma formação aos valores da solidariedade, ética, justiça, dignidade, sustentabilidade, conteúdos que enriquecem o pensamento e a capacidade operacional.
O Papa também reconhece que  em relação ao cuidado com o meio-ambiente ainda há muito a ser feito para mudar comportamentos e escolhas que não respeitam a casa comum, não obstante o progressos consideráveis neste sentido verificados em muitos países. A maneira como exploramos o planeta até agora, está nos fazendo pagar um alto preço. E a esta mesma mentalidade de exploração de recursos, está ligada a exploração, a exclusão, o descarte de seres humanos. Por isso existe a necessidade desta mudança de consciência, mudança de estilo e de atitudes.
Para Francisco - na esteira de seus predecessores e do magistério da Igreja - a economia deve estar a serviço do homem, ser inclusiva e promover um desenvolvimento integral.  Para tal objetivo, também a dimensão comunitária de uma empresa deve levar em consideração elementos como a distribuição e a participação na riqueza produzida, a inserção da empresa no território, a responsabilidade social, a igualdade de salários entre homens e mulheres, a conjugação entre tempos de trabalho e tempo de vida, o respeito pelo ambiente, o reconhecimento da importância do homem em relação à máquina, o reconhecimento do salário justo e a capacidade de inovação.
Em meio a tantos desafios, a mensagem do Papa Francisco é sempre de esperança, e para tal exorta que nossos projetos sejam inspirados pela compaixão, pela perspicácia e pela coragem, acolhendo assim cada ocasião para avançar na construção da paz.
Fonte: Vatican News 

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