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Para desviar a atenção dos
próprios fracassos, Bolsonaro e sua
gente vão atacar cada vez mais seus adversários políticos
e as minorias. (Bruno
Kelly/Reuters) |
Candidato
de extrema direita apela aos instintos mais baixos do ser humano, e seus
apoiadores incitam ao ódio e à violência. Não é necessário ser vidente para
saber que um governo de pessoas assim resultará no caos.
Jair Bolsonaro será o próximo
presidente da República. Não é necessário ser vidente para saber disso. É quase
impossível que Fernando Haddad ainda consiga vencer a eleição.
O Brasil entrará, então, numa nova
fase da autodestruição. Pois o projeto que Bolsonaro personifica não é
positivo: ele não desperta alento nas pessoas, não cria esperanças no futuro
nem se apresenta com ideias progressistas e modernos para um Brasil melhor.
Bem ao contrário: ele apela aos
instintos mais baixos. Ele representa aquilo que o ser humano tem de pior.
Ignorância, avareza, prepotência.
Isso ficou evidente já na noite da
eleição. Em Teresina, um homem com uma camiseta vermelha foi espancado em via
pública por uma turba. Em Salvador, um apoiador de Bolsonaro matou um professor
de capoeira a facadas porque este não gostava de Bolsonaro. No pequeno vilarejo
no Maranhão onde agora estou, um jovem de 18 anos me disse que em brêve iria
providenciar uma arma, como prometido por Bolsonaro, "para acertar
contas".
Mas é principalmente nas redes
sociais que o ódio dos apoiadores de Bolsonaro pode ser percebido. Adversários
são ameaçados sem qualquer pudor: sabemos onde você mora, sua família não
está mais segura, logo você será morto.
Uma amiga minha, negra, foi incluída
num grupo de Whatsapp no qual ela sofreu ameaças de cunho racistas e sexista.
Outros negros receberam mensagens no Facebook como esta: "Vc quer ir
embora meu brother? Então vai! Aqui é 17 sim! Vai ter arma de fogo sim! O
futuro Dono do Brasil não gosta de vcs, e se ele quiser ver vcs de perto ele
vai num zoológico."
Há pessoas que sentem prazer nesse
tipo de coisa, e a ascensão de Bolsonaro faz com que elas se sintam
encorajadas.
Também eu sou xingado cada vez mais
por causa da minha coluna na DW. Chamam-me de "parasita" e dizem que
eu deveria voltar correndo para a Alemanha. Um homem escreveu, no meu Facebook,
que eu sou "um esquerdista desesperado".
Mas não precisa ser um "esquerdista" para
ser contra Bolsonaro. Bastam decência, humanidade e senso crítico. Qualquer
conservador com valores e coragem estaria se posicionando contra ele. Eu teria
gostado de ver o Ciro ou até o Alckmin no poder, dois gestores capazes.
Agora me pergunto por que 49 milhões
de brasileiros se sentem representados por um homem que, em toda a sua vida,
não fez muito mais do que passar 27 anos sentado no Parlamento, embolsando um
tremendo salário. Nesse período, ele nunca se importou em ofender pessoas e falar
grosso. Aí ele colocou os próprios filhos nesse negócio lucrativo que é ser
político no Brasil. Também eles não se importam em ofender pessoas e espalhar o
ódio.
E essa família é ovacionada pelas
massas. Como explicar isso para alguém de fora? O Brasil não queria ser um país
sério?
Em 1936, o historiador Sérgio
Buarque definiu o arquétipo do brasileiro como "o homem cordial", em
seu livro fundamental Raízes do Brasil. Poucos anos depois, o
escritor austríaco Stefan Zweig considerava o Brasil "o país do futuro" sobretudo
porque, aqui, ele acreditava não ver nem fanatismo racista nem nacionalismo.
Por mais distorcida que fosse essa percepção, muitos brasileiros e estrangeiros
acreditaram nela.
Com Jair Bolsonaro, o homem cordial
virou o homem horrendo.
Sem nenhum pudor ele mostra uma
impressionante incompetência. Não tem uma resposta para nenhuma das questões
importantes do nosso tempo. Parece não ter lido nada além do livro do coronel
Ustra, um sadista que torturou pessoas. Bolsonaro não tem formação cultural – e
tem orgulho disso.
O governo de Bolsonaro vai atrair um
monte de radicais de direita e oportunistas. A corrupção vai aumentar e já
agora dá para prever que o Brasil não vai se acalmar. O Brasil vai sair mais
dividido dessas eleições.
Para desviar a atenção dos próprios
fracassos, Bolsonaro e sua gente vão atacar cada vez mais seus adversários
políticos e as minorias. É essa a estratégia que fez Bolsonaro crescer. É a
estratégia de todos os sistemas fascistas. A sociedade é lançada num estado de
guerra interna permanente: contra os moradores de favelas, os indígenas, os
defensores de direitos humanos e ativistas ambientais. E contra os
"esquerdistas".
A história está cheia de exemplos: um gritalhão fascinado por militares chega ao poder. Depois demora anos para lidar com a destruição que ele e seus seguidores causaram.
Deutsche Welle
Philipp Lichterbeck
queria abrir um novo capítulo em sua vida quando se mudou de Berlim para o Rio,
em 2012. Desde então, ele colabora com reportagens sobre o Brasil e demais
países da América Latina para os jornais Tagesspiegel (Berlim), Wochenzeitung
(Zurique) e Wiener Zeitung. Siga-o no Twitter em @Lichterbeck_Rio.
Fonte: domtotal.com
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