segunda-feira, 7 de janeiro de 2019
PAPA AOS DIPLOMATAS: NACIONALISMOS NÃO PREVALEÇAM SOBRE A JUSTIÇA E O DIREITO
O fio condutor do discurso do Papa
Francisco foi um apelo a reavivar a amizade e a colaboração entre as nações,
promovendo o sistema multilateral hoje em dificuldade, e buscando soluções
comuns para o bem de todos os povos.
Bianca
Fraccalvieri - Cidade do Vaticano
Realizou-se na manhã
desta segunda-feira (07/01) uma das audiências mais importantes no Vaticano: o
Papa Francisco recebeu os membros do corpo diplomático acreditado junto à Santa
Sé para as felicitações de ano novo.
Como é tradição, em
seu discurso o Pontífice faz uma análise da conjuntura internacional, com
considerações sobre acontecimentos passados e desafios no futuro próximo.
Diplomacia
Esta também é a
ocasião em que o Papa cita os acordos estipulados com a Santa Sé no decorrer do
último ano e os países visitados recentemente e a serem visitados nos próximos
meses: Panamá, Marrocos e Emirados Árabes Unidos.
“A Santa Sé não
pretende imiscuir-se na vida dos Estados, mas aspira a ser uma ouvinte solícita
e sensível das problemáticas que dizem respeito à humanidade, com o propósito
sincero e humilde de se colocar ao serviço do bem de todo o ser humano”,
afirmou Francisco, reforçando a tradição diplomática da Santa Sé.
De fato, a Santa Sé
mantém relações com 183 Estados, além da União Europeia e da Soberana Militar
Ordem de Malta.
“Premissa
indispensável para o sucesso da diplomacia multilateral são a boa vontade e a
boa-fé dos interlocutores”, declarou o Pontífice, manifestando sua preocupação
com o ressurgimento de tendências nacionalistas, com a busca de soluções
unilaterais e a opressão do mais fraco pelo mais forte. A globalização deve ser
uma oportunidade de desenvolvimento e não desencadear novas formas de
colonização.
“A paz não é jamais um
bem de parte, mas abraça todo o gênero humano”, recordou o Papa, sendo o
respeito pela dignidade de cada ser humano o fundamento para toda a convivência
realmente pacífica.
Para Francisco, o bom
político não deve ocupar espaços, mas iniciar processos.
A defesa dos mais
fracos
O Papa manifestou sua
preocupação com alguns temas e países, como por exemplo a “amada Nicarágua,
cuja situação acompanho de perto com esperança”.
Ainda na América
Latina, o Pontífice mencionou a Venezuela e agradeceu o acolhimento de
migrantes por parte da Colômbia.
Entre as pessoas sem
voz do nosso tempo, Francisco lembrou as vítimas de guerras em curso,
especialmente na Síria e em alguns países africanos, como Mali, Níger e
Nigéria. Iêmen e Iraque também foram citados.
No Oriente Médio, o
Santo Padre falou da importância da presença dos cristãos e da tensão
persistente entre israelenses e palestinos.
A dificuldade que a
comunidade internacional tem tido em lidar com o fenômeno migratório também fez
parte do discurso do Papa.
“ Mais uma vez desejo
chamar a atenção dos governos para todos aqueles que tiveram de emigrar por
causa do flagelo da pobreza, de todo o gênero de violência e perseguição, bem
como das catástrofes naturais e das perturbações climáticas, pedindo que se
facilitem as medidas que permitam a sua integração social nos países de
acolhimento. ”
Diante da tendência da
Europa e da América do Norte de fechar as fronteiras, Francisco recordou: “Todo
ser humano anseia por uma vida melhor e mais feliz e não se pode resolver o
desafio da migração com a lógica da violência e do descarte nem com soluções
parciais”.
O Papa citou a
importância da aprovação dos dois Pactos Globais sobre Refugiados e sobre a
Migração segura, ordenada e regular, não obstante existam ressalvas quanto a
certas terminologias adotadas.
Infância e juventude
Os jovens e as
crianças não ficaram de fora do discurso do Papa. De modo especial, ele
recordou este ano o trigésimo aniversário da Convenção sobre os Direitos da
Criança.
Nesta circunstância,
Francisco falou dos abusos contra os menores, que “constituem um dos mais vis e
nefastos crimes possíveis”, cometidos também por vários membros do clero.
“A Santa Sé e toda a
Igreja estão se esforçando por combater e prevenir tais delitos e o seu
encobrimento, acertar a verdade dos fatos em que estão envolvidos clérigos e
fazer justiça aos menores que sofreram violências sexuais, agravadas por abusos
de poder e de consciência”, reiterou o Pontífice, recordando o encontro em
fevereiro próximo com os Episcopados de todo o mundo.
Mulheres
A violência contra a
mulher também foi condenada pelo Santo Padre.
“É urgente descobrir
formas de relações justas e equilibradas, defendeu Francisco, sem desnaturar,
porém, “o próprio ser homem ou mulher”.
A discriminação das
mulheres no trabalho também deve ser combatida. E por falar em trabalho, o
Pontífice falou das condições laborais que muitas vezes levam a uma forma
moderna de escravidão, onde inclusive crianças são manipuladas.
Construtores da paz
Em meio a
preocupações, há iniciativas e acordos a serem louvados, como no caso da
Ucrânia, da península coreana, do Sudão do Sul, da Etiópia e da Eritreia.
À África, em especial,
o Pontífice dedicou um inteiro parágrafo para ressaltar o “potencial dinamismo
positivo” do continente, que nos últimos tempos tem implementado iniciativas de
inclusão e desenvolvimento.
Repensar o nosso
destino comum
Por fim, o Papa
recordou um traço da diplomacia multilateral: o futuro.
Neste contexto,
Francisco falou de dois temas em particular: a corrida armamentista e o meio
ambiente.
“Infelizmente, pesa
constatar que o mercado das armas não só não parece sofrer interrupção, mas ao
contrário existe uma tendência cada vez mais difusa para se armar por parte
tanto dos indivíduos como dos Estados.”
Amazônia
Quanto à preservação
do meio ambiente, o Santo Padre recordou que “a Terra é de todos e as
consequências da sua exploração recaem sobre toda a população mundial, com
efeitos mais dramáticos em algumas regiões”.
Entre essas regiões,
Francisco mencionou a Amazônia, que estará no centro da próxima Assembleia
Especial do Sínodo dos Bispos, prevista para o mês de outubro no Vaticano.
“Apesar de tratar
principalmente dos caminhos da evangelização para o povo de Deus, não deixará
também de enfrentar as problemáticas ambientais em estreita relação com as
consequências sociais.”
O longo e articulado
discurso do Papa se concluiu com a tônica adotada em todo o pronunciamento: de
que a comunidade das nações é um elemento em construção, baseada não somente na
amizade e na confiança, mas também na justiça e no direito, tendo em vista a
paz e o bem integral da pessoa humana.
“Para todos vós,
prezados Embaixadores e ilustres Hóspedes aqui reunidos, e para os vossos
países, formulo cordiais votos de que o novo ano permita reforçar os vínculos
de amizade que nos ligam e trabalhar para construir a paz a que o mundo
aspira.”
Fonte: Vatican News
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