Podemos ter enormes e fundadas críticas em relação ao chavismo e ao governo de Maduro, mas, de nenhuma forma, nos é permitido relativizar a vontade popular.
No dia 23 de janeiro de 2019 o presidente da Assembleia Nacional
Venezuelana, Juan Guaidó, declarou que o governo de Nicolás Maduro é ilegítimo,
assumindo provisoriamente a Presidência do país. Mas, nenhum fato novo foi
alegado em relação à legitimidade do atual presidente, o que torna a atitude um
crime contra a soberania do país. Cômico, não fosse trágico.
A eleição de Maduro ocorrida no ano passado (maio de 2018) foi
fiscalizada e avalizada por uma comissão internacional, como ocorrido nas
últimas 21 eleições venezuelanas dos últimos 21 anos. Como votar não é
obrigatório no país, compareceram às urnas 46% dos 20 milhões de eleitores, dos
quais 68% votaram em Maduro, dando-lhe 29% de apoio do eleitorado. Para
comparação, no Brasil, de voto obrigatório, Bolsonaro foi eleito com 10% a mais
do eleitorado.
Alguns países, liderados pelos Estados Unidos, fazem boicote
comercial à Venezuela, gerando desabastecimento de itens essenciais como
alimentos e medicamentos e colapsando políticas públicas de saúde entre outras.
Trata-se de explícita política de desestabilização. Esse estado de coisas dura
há alguns anos, prejudicando a vida das pessoas e fomentando conflitos, como os
migratórios e outros, inclusive políticos. Logo após a declaração de Juan
Guaidó um grupo de 13 países, dentre os quais o Brasil, liderados pelos Estados
Unidos, reconheceu a legitimidade do presidente da AN em assumir a Presidência
interinamente. Coincidência?
Para a mídia brasileira, alinhada à Venezuelana (majoritariamente
de oposição ao chavismo), o que sustenta Maduro é o apoio do exército.
Pergunto: Qual governo se sustentaria sem o apoio do próprio exército? Difícil
dizer. Contudo, a mesma mídia diz que a melhor saída para a crise seria a
renúncia de Maduro, por ter supostamente perdido o apoio popular. Baseiam-se
nas grandes manifestações contra o governo ocorridas no dia 23, mesmo dia das
declarações de Guaidó. Não mencionam que ocorreram, com dimensões assemelhadas,
enormes manifestações de apoio ao governo Maduro no mesmo dia em local distinto
na Venezuela. A ideia é desinformar e propiciar um clima internacional de
ilegitimidade de Maduro e derrota do movimento chavista.
Ao que tudo indica a atitude de Guaidó, foi combinada com atores
externos, leia-se Estados Unidos da América e companhia, agora com o apoio e a
submissão do Brasil bolsonarista. Nem mesmo o líder oposicionista venezuelano,
ex-governador de Miraflores, que já foi candidato a presidente, Henrique
Caprilles, apoiou a atitude de Guaidó, visto como um outsider, já que ele não
tem respaldo institucional e militar.
No mesmo sentido, os atos de 23 de janeiro foram precedidos por um
vídeo do vice-presidente norte-americano em que afirma que Maduro é um ditador
e que seu governo é ilegítimo, sem maiores esclarecimentos de onde vem esta
conclusão. Em seguida à declaração de Guaidó os primeiros apoios foram dos
próprios EUA, do Brasil, Colombia e outros aliados ao imperialismo. Em reação
Maduro cortou as relações diplomáticas com os EUA e deu 72h para retirada de
seus representantes do país.
De outro lado, não reconheceram a autoproclamação importantes
países como Rússia, China e México, além dos vizinhos Bolívia e Cuba. A lista
de países que reconhecem a legitimidade de Maduro é imensamente maior, contudo
a mídia só se refere a quem se manifestou após o episódio, desconsiderando os
que reconheceram a eleição de maio de 2018 e não emitiram opinião pós dia 23 de
janeiro.
Considerando estas informações e o histórico de relações
internacionais dos países ricos com a Venezuela, não posso deixar de concordar
que um golpe de estado está em curso em nosso vizinho, mais uma vez. Como não
poderia deixar de ser, desta vez com apoio dos golpistas tupiniquins que hoje
ocupam o Planalto.
Podemos ter enormes e fundadas críticas em relação ao chavismo e ao governo de Nicolás Maduro, mas, de nenhuma forma, nos é permitido relativizar a vontade popular dos venezuelanos e dizer que seu governo, legitimamente eleito, perdeu o apoio popular e por isso deve retirar-se. Essa postura, inclusive de grande parte da mídia nacional, é composta da mesma irresponsabilidade e golpismo que coadunou com o impedimento de Dilma Rousseff. Mas, como sabemos, na Venezuela é diferente, e como cantam as forças militares bolivarianas em vídeo que circula na net, caso venha a ser deflagrado o golpe físico, a Venezuela será o Vietnã sul americano.
Por Marcel Farah, Educador popular.
Fonte: domtotal.com
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