Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães Bispo auxiliar de Belo Horizonte
Riquezas das Minas Gerais, seus
minérios e tantas outras maravilhas, que tão generosamente nos foram dadas pelo
Criador, transformaram-se em sua perdição. Minas vê, gravíssima e rapidamente,
seus rios, lagos, afluentes, terras agricultáveis, comunidades e suas culturas
sendo dizimadas. São cometidos crimes contra a vida humana, contra o meio
ambiente e contra o direito de viver em comunidade e em família.
Na Encíclica Laudato si, o Papa Francisco nos alerta para a
necessidade da urgente compreensão de que o Planeta agoniza e clama contra o
mal que provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus
nele colocou.
O que foi legado ao homem para que
prospere e tenha uma vida plena e a transmita às futuras gerações, a ação
irrefreavelmente gananciosa e criminosa das mineradoras destrói em tão pouco
tempo. Vemo-nos diante da débil regulação deste setor pelo Legislativo, eivado
de pessoas financiadas por essas empresas e que são autorizadas pelo Executivo,
imiscuído em múltiplos interesses nem sempre republicanos e precariamente
fiscalizadas pelos órgãos que existem para isso. Soma-se a isso um Judiciário
leniente, ensimesmado, caríssimo, insensível, pretensioso e divorciado do povo
brasileiro. Foi assim em Mariana, pela Vale/Samarco, até hoje “na justiça”; é
assim em Brumadinho, pela Vale. Não podemos deixar que assim continue.
Não houve um acidente nessas Minas
Gerais. Houve um crime ambiental e um homicídio coletivo. Uma matança de
pessoas, animais e do meio ambiente. Quase mataram também a esperança, a fé, a
dignidade e o amor das pessoas que sobraram, agora terrível e
indescritivelmente sofridas, mas em processo curativo, em reconstrução,
soerguimento, revitalização e retomada de posse de sua brava dignidade. Como
não há uma empresa mineradora em abstrato, as pessoas que nela atuam e têm
responsabilidade sobre esta tragédia devem ser rigorosamente punidas, para que,
juntamente com a mineradora, não caiam em desgraça também os que exercem os
poderes acima citados e já tão pouco acreditados. Conscientemente, as
mineradoras optam, por serem mais baratos, por modelos de exploração de minério
de ferro e de outros metais mais danosos ao meio ambiente e à vida humana. O
lucro exorbitante, quase ilimitado, com pouco retorno à sociedade por meio do
poder público, é o único critério e preside, inconsequentemente, as decisões em
relação aos modelos de exploração dos recursos naturais.
Por causa dessa sede insaciável e
enlouquecida por riquezas cada vez maiores, concentradas sempre mais nas mãos
de pouquíssimas pessoas, empresas mantêm trabalhadores na pobreza a vida
inteira e expostos à morte. A mineração em nosso País se tornou eticamente
insustentável, calamitosa e de altíssimo risco para a vida humana e toda a vida
existente em suas áreas de atuação.
A dimensão cruel e potência danosa
da reincidência desses crimes nos apontam que apenas o fato de não se tratarem
de um contexto de conflito armado é que os distingue de serem entendidos como
crimes de lesa-humanidade. As práticas de seus infratores, afinal, se mostram
sistemáticas, resultam da clareza dos riscos e danos de suas ações em covardes
atos desumanos e contra a população civil. Por isso mesmo, urge que as pessoas,
organizações e instituições que valorizam a vida humana, que querem defender a
natureza dessa progressiva e suicida destruição, se insurjam contra esse modelo
de negócio que enriquece tão poucos, destruindo a vida de tantos. Do modo
que se realiza, esta economia mata, repito o Papa Francisco, o maior líder
humanitário do mundo atual.
É inadmissível a persistência desse
modelo econômico de enriquecimento pela destruição. É impossível continuarmos
aceitando que a natureza, obra-prima de Deus, seja sistematicamente destruída.
E que milhares de trabalhadores, idosos e crianças, mulheres e jovens,
prevalentemente os mais pobres e humildes, sejam diariamente expostos ao risco
de morrer em função de uma ganância deplorável.
Precisamos, talvez como nunca antes,
como nos convoca o Papa Francisco, cujo nome tem inspiração em São Francisco de
Assis, “exemplo por excelência pelo cuidado com o que é frágil e a ecologia
integral, vivida com alegria e autenticidade” (Laudato si), de um
debate que una a todos, porque o desafio ambiental diz respeito e tem impacto
sobre todos nós
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