É
possível tirarmos lição do ecatombe que estamos a viver? Estamos dispostos a
construir uma nova humanidade pautada na cooperação, ternura, razão cordial?
Não sabemos, pois, já tivemos outras oportunidades tão trágicas e desumanas e
não o fizemos, não mudamos de rumo. Quando Hernán Cortés, em 1519, chega ao
planalto de Anahuac (México) , acadêmicos estimam que ali havia 25 milhões de
habitantes; depois de 76 anos, em 1595 restavam apenas 1. 375.000 hab, ou seja,
a presença do colonizador e sua espada mortífera tinha ceifado de 25 para 1.
A Segunda Guerra Mundial dizimou 85 milhões de
seres humanos, dos quais 50 milhões eram civis. Essas barbáries infelizmente
não foram suficientes para nos ajudar na construção de uma civilização com
respeito ao diferente, da valorização da vida, além de continuar em nossas
veias o DNA e o instinto genocida dos nossos colonizadores. A indústria da
carnificina em nada serviu para nos sensibilizar, continuamos indiferentes,
insensíveis, mumificados. Apostando na força bélica, da virulência para
apaziguar as disparidades sociais. Será
que esse novo ecatombe que se anuncia, nos levará a uma mudança de rumo? De
postura? De comportamento?
Mas
deixemos o pessimismo para dias melhores, como diz o poeta. Estamos diante de
algo completamente novo. Toda a humanidade
está em risco e poderá ser
sucumbida por um inimigo invisível, como invisíveis também são aqueles que
foram gerados por políticas que sobrepõem às cifras econômicas em detrimento
dos valores da vida, não apenas humana, mas de todo o ecossistema planetário.
Enfim, precisamos sair da pandemia dispostos a construir um novo paradigma,
agora alicerçado verdadeiramente na cooresponsabilidade, sensibilidade humana,
compromisso social, sobretudo, com a
Casa Comum.
Insensíveis
como somos, nada fazemos, sempre o problema é no outro e do outro, nunca meu.
Mas não podemos nos dar o luxo da esquiva, da “postura do avestruz”, podemos e devemos fazer algo na esfera religiosa, como faríamos um bem
enorme se trocássemos a teologia da prosperidade pela do cuidado; na esfera
econômica: da voracidade do lucro e
concentração de renda para a distribuição equitativa; na política: da má
gestão administrativa/burocrática, para a responsabilidade e eficiência não só
de arrecadar tributos mas de utilizá-los; na ciência, descermos do pedestal
autossuficiência, arrogância intelectual, para valorização de outras fontes de
saber e de conhecimento.
A
crise não é apenas do covid19, esse pode não ser como ingenuamente pensamos, o
elemento causador, mas simplesmente, demonstra ser o sintoma de algo mais grave
e profundo que está acontecendo – a terra como um superorganismo vivo está
perdendo sua capacidade de se autorregular, os acadêmicos estão cada vez mais
convencidos de que os tsunamis, maremotos e secas..., enfermidades atuais como:
dengue, ebola, chikungunya e o próprio convid19..., apontam para o esgotamento
autorregulador da própria terra. “ Nunca maltratamos e ferimos nossa Casa Comum
como nos últimos dois séculos”, afirma o papa Francisco. A agressão é tão
truculenta que a cada ano varre-se da face da terra mais de mil espécies de
seres vivos. Não estamos vivendo aquilo
que J. Lovelock nominou como “ a
vingança da Gaia”?
A
solução da crise de proporção planetária, seria apenas encontrar a tão desejada
e esperada vacina? Possivelmente, não! a mãe terra jamais se contentará com
migalhas, sua ferida visceral é tamanha que seu clamor urge por atitudes,
comportamentos capazes de respeitar seus limites e ritmos, posturas que nos
faça filhos e filhas e não algozes, nefastos, geocidas. Sob pena de não mais
nos querer sobre a sua face. A terra demonstra ser a grande profetisa que em
tempo de escuridão existencial pronuncia seu oráculo: “Ela não precisa de nós.
Nós precisamos dela”. É possível que
estejamos diante da última oportunidade que ela nos oferece para recomeçarmos a
repensar e mudar as nossas atitudes ecocidas, construindo um novo paradigma
humano e civilizatório.
Autor: Pe. Jânio Carvalho dos Reis – janioreis16@yahoo.com
Pároco da Paróquia Sagrado Coração de Jesus -
Bequimão; Psicólogo
Especialista em:
·
Atendimento em
Orientação Familiar e Processos Psicoterapêuticos;
·
Tanatologia e
Atendimento às Famílias Enlutadas;
·
Teologia
Pastoral;
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