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Escravos cortando a cana de açúcar na ilha de
Antígua, 1823 (British Library) |
No mundo atual, milhões de pessoas vivem em situação semelhante
à escravidão. No passado, Igrejas e religiões conviveram com isso e até
legitimaram essa estrutura em nome de Deus. Hoje, é preciso considerar a luta
contra qualquer tipo de escravidão como ato espiritual
Atualmente, no
Brasil, poucas pessoas recordam o 13 de maio como data a ser celebrada. De
fato, a lei áurea que, em 1888, decretou a abolição da escravatura deixou a
população escrava sem qualquer amparo. Assim, serviu para propiciar novas
formas de escravidão até mais econômicas e mais seguras para os senhores.
Atualmente, o próprio governo federal esvazia órgãos de proteção ao
trabalhador, sanciona leis que favorecem o trabalho precário, incentiva invasão
de terras indígenas e criminaliza movimentos sociais. Apesar disso, nos últimos
20 anos, pela força de organismos da sociedade civil e de Igrejas, quase 50 mil
pessoas foram libertadas de fazendas, nas quais trabalhavam acorrentadas, ou
sob mira de armas ou apenas para ganhar comida e leito para dormir. Apesar
disso, em todo o país, ainda existem empresas rurais, carvoarias e fábricas de
fundo de quintal que empregam pessoas em condições semelhantes à escravidão.
Conforme pesquisas atuais, no Brasil, 50% da escravidão atual acontece no setor
pecuário.
De acordo com Jessé de
Souza, em seu livro A classe média no espelho, a sociedade
brasileira ainda é profundamente escravagista. Em um país de 210 milhões de
habitantes, apenas 800 pessoas determinam tudo o que acontece no país. Há mais
de cem anos, a maioria da classe média se junta sempre com a elite, para
explorar os milhões de pessoas mais pobres. A elite controla todos os grandes
meios de comunicação e garante que sua ideologia continue defendida por
intelectuais poderosos e algumas universidades importantes. Se, por acaso,
ocorrer que um presidente ou governante quiser mexer na exclusão das massas,
basta acenar com a palavra mágica “corrupção”. Afinal, sempre foi esta a arma
para derrubar presidentes. Em 1954, forçaram Getúlio Vargas a suicidar-se. Em
1964, com este mesmo pretexto, derrubaram o presidente João Goulart e
instalaram a ditadura militar. Em 2016, inventaram o impedimento da presidente
eleita, assim como em 2018, condenaram sem provas o ex-presidente Lula.
Nestes dias, em plena pandemia, empresários e representantes do capital
fizeram manifestações em São Paulo. Devidamente fechados em seus carros de
luxo, os carros de som gritavam: O Brasil não pode parar. Assim, diziam: vocês,
trabalhadores pobres têm de voltar para produzir riqueza para nós. Se a
abertura de fábricas e do comércio contagiar mais gente e produzir mais mortes,
não tem importância porque será entre vocês pobres. Nós, ricos, estaremos
protegidos em nossos castelos, ou apartamentos de luxo.
Infelizmente, o retrato
do resto do mundo não é diferente. De acordo com a Walk Free Foundation
(Fundação Caminhar em Liberdade), ONG que compila anualmente um Índice Global
da Escravidão, calcula-se que, atualmente, mais de 60 milhões de pessoas vivam
como escravos/as. A pesquisa aponta que a escravidão existe em 167 países,
mesmo na Europa e na América do Norte. As formas atuais da escravidão podem ser
trabalhos precários e desumanos, o tráfico de escravas e escravos sexuais,
trabalho infantil não remunerado e assim por diante. Na Inglaterra, Kevin
Bales, professor de sociologia da Universidade de Surrey, declarou que, já no
começo do século XXI, no Reino Unido, 27 milhões de pessoas viviam na
escravidão. Como será atualmente?
A Oxfam- Solidarity
afirma que antigamente um escravo era um investimento pesado. No século 19,
comprar um escravo era como, atualmente, adquirir um trator. Atualmente, no
mundo escravos são baratos e numerosos. Na Europa, um migrante clandestino pode
ser adqurido como escravo por módicos 125 euros. No Fórum Econômico Mundial que
aconteceu em janeiro de 2020 em Davos, Suiça, a Oxfam mostrou que esta
realidade vem do fato de que, no mundo inteiro, “2.153 bilionários têm mais
riqueza do que os 4,6 bilhões de pessoas, que constituem 60% da população
mundial.” Movimentos sociais protestaram que a desigualdade ainda é muito
maior do que esta aí revelada.
Para quem tem fé, o pior
é saber: os países que sustentam esta estrutura são aqueles que têm o nome de
Deus na sua Constituição e se dizem cristãos. Os que têm menor desigualdade
social são os que se dizem não religiosos. Na Idade Média, escrevia um místico
cristão: "Que Deus nos livre de Deus!" (isto é, desta
imagem de Deus que aparece na célula do dólar e na parede dos palácios dos que
zombam do nome divino). Para salvar o nome de Deus que anda tao mal falado,
temos mesmo de lutar contra todo tipo de escravidão.
Marcelo Barros
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