sexta-feira, 3 de julho de 2020

O AMOR NOS TORNA VULNERÁVEIS



    • Pe. Júlio Lancelotti é um exemplo de amor ao 
    • próximo (Adonis Guerra/ Fotos Públicas)
Se seguro na mão dos bons sentimentos já não sinto assim tantos golpes duros
O amor não nos torna infalíveis. Antes o amor nos torna vulneráveis. Ainda mais nesses tempos de culpas não expiadas, sentimentos colocados sob os tapetes, como se escondêssemos sujeiras. Estamos tão expostos, tão com os nervos à flor da pele, como balbucia a canção, que qualquer possibilidade de abraço se torna uma conquista.
Queremos abraçar e queremos ser abraçados nesse Titanic enquanto nem sequer uma orquestra tosca executa um réquiem fajuto para nos tornar a travessia mais leve. Precisamos ouvir coisas boas, ver coisas boas, tecer loas ao que deve ser louvado, mas parece que não sobra ânimo nem tempo mesmo que pareça que o tempo esteja preguiçoso e pandêmico ao nosso dispor.
Hoje , sinceramente, não estou preocupado com exercício de estilo e nem tão pouco ficarei incomodado se alguém disser que essas mal traçadas são um show de pieguice. Sentimental demais, sim. Eu atravesso o coro dos descontentes para dizer que amar o outro, infelizmente, nos torna vulneráveis na medida em que o que conta é você amar a si próprio nessa eterna  disputa a que somos submetidos todos os dias na maldita sociedade de consumo.
Muitas vezes tenho ouvido conceitos risíveis sobre o sucesso. Sucesso é ter alto salário, ser fluente em inglês, viajar para o exterior todo ano, ter casa própria, carro bacana, dinheiro para desperdiçar no fim de semana. Sucesso é o acumulo de seguidores nas redes sociais, é a afinação e arte de exibir opulentas conquistas amorosas, de exercer a mais profunda ignorância humanística contanto que os resultados sejam compensadores.
Diante disso a maioria de nós somos fracassados. Mas fracassado não é sinônimo para perdedor não. Diante desses ganhos estúpidos prefiro ficar aqui com minha sina de pseudo-perdedor a contemplar paisagens já vistas e outras que ambiciono ver. Curtir à distância  meia dúzia de crianças sorrindo e correndo num domingo no parque . Ver um pica-pau amarelo debulhar um tronco exaurido. Sentir no olhar do seu cão toda a ternura do mundo enquanto toma chá de camomila.
Estou transbordado de emoções baratas porque estou ciente, a essa altura, do quanto o amor nos torna vulneráveis.  Ao mesmo tempo, se seguro na mão dos bons sentimentos já não sinto assim tantos golpes duros mesmo com a guarda baixa. Me miro nos bons exemplos e a maioria deles não usa farda. No momento em que redijo, o bom exemplo vem de um sacerdote que sempre está do lado dos excluídos e que inspirou essas linhas com seu raciocínio de que o amor não nos torna infalíveis. É o padre Júlio Lancelotti, mais franciscano do que o mais franciscano possa ser na medida em que não está dando para receber. Nem perdoando para ser perdoado. Está derramando amor ao lumpesinato enquanto eu que escrevo e você que lê só contempla. Ter amor a quem transborda amor não nos transforma em infalíveis. E, sim, nos torna vulneráveis. A olhar as coisas boas da existência e a dizer simplesmente um "sim" bendito. Sim ao dia novo que começa, mesmo que você não queira, porque na verdade não queremos e nem podemos nada diante do inevitável. Resta apenas saber se diante dele você é um mero espectador ou alguém que participa. Ao menos com um olhar generoso sobre os seus semelhantes diante de tanta iniquidade.
*Ricardo Soares é escritor, diretor de tv, roteirista e joralista. Publicou 9 livros. O mais recente, 'Devo a eles um romance' em pré-venda no site da editora Penalux em www.editorapenalux.com.br

Fonte:domtotal.com 


Um comentário:

  1. Parabéns ao padre Júlio. Um cristão de verdade. Hoje há muitos de fachada . Se escondem atrás das orações sem ação

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