“Dai-nos um pouco de óleo,
porque nossas lâmpadas estão se apagando” (Mt 25,8)
As parábolas são relatos provocadores, que
revelam o sentido da vida a partir de uma perspectiva diferente. Não são
histórias edificantes, nem meditações piedosas, mas enigmas para pensar,
decifrar e decidir o horizonte da vida. As parábolas não fecham a mensagem (não
são dogmas, nem demonstrações), pois são sinais que cada um deve interpretar e
resolver a partir de sua própria vida.
Frente
às parábolas, uma pessoa pode rebelar-se, outra pode descobrir o lado oculto de
sua vida... Por isso, são imagens interativas que não tem a solução dada de
antemão. É surpreendente a insistência com que Jesus fala da vigilância; são numerosas as parábolas que
nos convidam a adotar uma atitude desperta e atenta frente à existência, para
que esta tenha um sentido.
Interpretar
a parábola deste domingo no sentido de que devemos estar preparados para o dia
da morte, é falsificar o evangelho. A parábola não está centrada no fim, mas na
inutilidade de uma espera que não é acompanhada de uma atitude de amor e de
serviço. As lâmpadas devem estar sempre acesas, para ajudar a acolher as
gratas surpresas da vida e poder participar da festa d’Aquele que continuamente
vem ao nosso encontro. Se não queremos ser insensatos (sem sentido, sem
direção), precisamos estar alertas, para entrar em sintonia com a realidade e
viver a vida como deve ser vivida.
Nossa
maior insensatez seria viver “sem horizonte”, sem desejos e sonhos, sem uma
causa mobilizadora... Submergimos no presente sem outra perspectiva mais ampla;
e assim afogamos nossa vocação de infinitos na vulgaridade de uma vida
superficial e satisfeita. Se estamos adormecidos, é preciso despertar, porque,
do contrário, perderemos a oportunidade de entrar na festa das
núpcias. Portanto, ser “imprudentes” significa viver “dispersos”,
“distraídos”... deixando apagar a lâmpada de nossa fé e de nossa esperança, e
sem o azeite de reposição.
A
lamparina que arde é a prática da mensagem de Jesus; o azeite que alimenta a
chama, é o amor manifestado. Assim entendemos porque as jovens prudentes não
podem compartilhar o azeite com as imprudentes. Não se trata de egoísmo; é
impossível amar em nome de outra pessoa ou considerar como própria a entrega
que o outro realizou. A lamparina não pode queimar com o azeite de outro; a
chama não pode ser acesa com azeite comprado ou emprestado.
A
parábola do Evangelho nos fala daqueles que não cultivam sua esperança hoje e
pretendem viver do azeite das lâmpadas dos outros. E ninguém pode viver da fé
do outro, nem da esperança do outro. O sentido de toda uma vida não pode
ser improvisado em um instante. Somente a partir da luz de Deus em nós,
descoberta, reconhecida e ativada, poderemos viver antenados com o melhor que
há em nosso interior (azeite) e com a realidade que nos envolve, cheia de
surpresas.
Todos
nós somos portadores de uma lâmpada e todos somos convidados à festa. Podemos inspirar-nos mutuamente a
viver a partir de nossa verdade mais profunda, a partir da luz que nos habita; mas, no final, a
falta ou não de azeite para a nossa lâmpada depende de cada um(a), de nossa
responsabilidade, de nossa previsão, do cuidado delicado e agradecido diante de
tudo o que foi recebido, da capacidade para sustentar a esperança nas noites
escuras e, sobretudo, do amor e da alegria que alimentamos no desejo de nos
encontrar, dia a dia, com o Noivo, seguros de que Ele sempre vem.
Só
assim seremos luz verdadeira para os outros, iluminaremos – humildemente – as
obscuridades que nos envolvem, e contagiaremos a alegria de sabermos que fomos
convidados à festa. O que permanece em nosso interior é o fulgor (luz) que
vivemos (que brilha) por dentro, ao fazer memória da nossa vida, esse “eu profundo” que é mais “eu” que eu mesmo:
“eu” original, iluminado, santo, intocável, faísca de luz que se volta para
Aquele que é Fonte de toda luz.
O “ego” é como um planeta do sistema
solar; não tem luz própria. Adquire sua luz emprestada e, portanto, vive no
engano de que pode continuar sempre assim, no tempo e no espaço. Por isso,
o ego inflado com a luz que não é própria, busca, de maneira desenfreada,
apoderar-se de tudo aquilo que lhe dá a ilusão de brilhar: poder, riqueza,
vaidade... Falsas luzes que um dia se apagarão.
O
“eu original”, no entanto, vai ao encontro da luz verdadeira, presente no
próprio interior, e deixa-se iluminar por ela; é esta pequena chama que o
conduz em direção Àquele que é a Luz, para entrar e participar do seu festim
iluminado. Por isso, nós somos, ao mesmo tempo, a lâmpada, o azeite e a luz. Ninguém pode nos emprestá-los,
porque é nossa própria vida. Toda vida se move a partir de dentro.
Dentro
de nós devemos descobrir a luz que iluminará nossos passos; essa chama, se é
autêntica, não pode se ocultar, pois iluminará também a todos os outros. Uma
luz que acende outras luzes. Contemplai admirados essa luz que somos! E,
mesmo nosso pequeno “ego” brilhará, atravessado por essa luz como o sereno pelo
sol do amanhecer.
A
parábola deste domingo, portanto, nos provoca a uma tomada de posição: “em qual
dos dois grupos eu me encontro? Em qual deles desejo estar?” A narração usa as imagens das
lâmpadas e do azeite como símbolos que marcam a diferença entre um grupo e
outro.
Nossa
vida, enraizada na Vida d’Aquele que é a Luz do mundo, é chamada a irradiar luz,
a iluminar a realidade na qual habitamos, embora, muitas vezes, a noite escura
nos envolve.
“Vós sois a luz do mundo” (Mt 5,14).
“Em que situação se encontra minha lâmpada? E minha reserva de
azeite? De que modo colaboro para que o Noivo possa celebrar a festa? Como sou
luz em meio a tantas noites de ódio e violência pelas quais nosso mundo
atravessa?” Na
realidade, de acordo com a parábola, todas as jovens carregavam suas lâmpadas;
todas elas tinham sido convidadas à festa; todas alimentavam o mesmo desejo:
aguardar a chegada do noivo. O fato de pertencer a um grupo ou a outro não se
impõe a partir de fora. Cada uma das personagens da parábola, no fundo, foi
livre e decidiu com sua atitude (previdente e sábia, ou imprudente e
descuidada), em quê grupo situar-se.
Hoje
em dia existem, nas igrejas e capelas, as velas para todos os gostos; existem
aquelas eletrônicas, que são ativadas com uma moeda; e existem até aquelas que
podem ser acesas a longa distância, pela internet. Mas, velas originais são
aquelas que se consomem na nobre missão de iluminar. Simbolizam a travessia da
própria existência: queima-se a cera como nós vamos nos queimando,
diminuindo-nos com a passagem do tempo, as dificuldades e as alegrias de nossa
travessia humana.
Quando
acendemos a chama, é como se tomássemos consciência de que somos luz na medida
em que vamos nos gastando em iluminar nosso entorno e chegar a ser cera
derretida um dia, tarde ou cedo; passar de luz natural a reencontrar-nos com a
Luz total da qual procedemos.
Texto bíblico: Mt 25,1-13
Na oração: A esperança mantém sempre acesa a faísca de luz que todos carregamos dentro. É
ela que nos faz cair na conta que somos “luz do mundo”, uma chama que nunca se apaga; somos “sarça ardente” para os outros, consumindo-nos
constantemente, através da vida doada; somos uma lamparina humilde, brilhando
na janela da nossa pobre casa, indicando aos outros o caminho da segurança e do
aconchego.
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Como você deixa transparecer a luz no seu agir cotidiano? Qual é o azeite que brota do seu coração e que
alimenta a luz de sua humilde lamparina?
Pe. Adroaldo Palaoro sj
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