É essa a economia que queremos? Foto (Pixabay)
Élio Gasda
Como pensar a economia diante dos mais de 800 milhões de famintos no
mundo, dos 83 milhões de refugiados e dos mais de 200 milhões de desempregados?
“O atual sistema mundial é insustentável por diversos pontos de vista”
(Laudato Sí, n. 139). A violência contra os mais pobres, contra os
trabalhadores e contra a natureza é consequência da economia que temos.
O Reino de Deus anunciado por Jesus pode estimular a sociedade a buscar
modelos de organização social baseados na justiça e criar instituições a
serviço da vida?
Não há saúde, alimento, moradia, vestimenta, sem economia. A Bíblia não
é um livro de economia. Contudo, é possível esboçar aproximações aos relatos
que tocam na dimensão da economia.
A perspectiva cristã da economia encontra-se no conceito Reino de Deus.
Sua característica mais determinante é a centralidade do pobre: Felizes os
pobres! (Lc 6,20s). O Messias dos pobres é pobre. Nazaré, sua cidade, era um
aglomerado de barracos de barro, onde vivam camponeses, desempregados,
semianalfabetos.
Os humilhados, em sua maioria, são os que se aproximam a Jesus.
Multidões com fome, sem trabalho e espoliadas pelo Estado e pela religião. O
Sermão da Planície (Lc 6,20-26) anuncia a eles a inversão de sua sorte (Lc
4,18), proclamada no Cântico de Maria, a mãe de Jesus. “O Senhor derrubou os
poderosos de seus tronos e exaltou os humilhados. Encheu de bens os famintos, e
mandou embora os ricos de mãos vazias” (Lc 1, 52-53).
A realidade econômica pode ser modificada! O Evangelho pode inspirar a
sociedade a buscar modelos de organização econômica. A mensagem de Jesus é
incompatível com uma economia excludente, injusta e violenta. Deus é Deus dos
pobres. Pobre entendido não somente como classe social explorada
economicamente, mas também o negro, o indígena, a mulher, a comunidade LGBT, o
migrante, o idoso, a população em situação de rua.
O primeiro critério para discernir a economia que temos e sonhar uma
economia que queremos é estar ao lado dos descartados e espoliados. Eles
desmascaram os responsáveis pela violência. O segundo critério é reconhecer o
sistema econômico como pecado do mundo (Jo 1,29).
Há uma violência institucionalizada. A perversidade do capitalismo é
estimulada pela idolatria do dinheiro. “Vocês não podem servir a Deus e ao
Dinheiro” (Mt 6,24; Lc 16,13). Essa é a sentença mais anticapitalista da
história.
Todo sistema alicerçado na injustiça e na violência contém elementos
idolátricos. A idolatria do dinheiro é o pressuposto mais disfarçado do
capitalismo. A adoração do dinheiro não é apenas um pecado contra Deus, é
também a maior ameaça à vida. Coloca em risco o planeta inteiro.
“No centro do sistema econômico está o deus dinheiro. Todo sistema
centrado no deus dinheiro necessita saquear a natureza” (Papa Francisco). A
humanidade não foi criada para ser uma escrava do dinheiro. O Cristianismo é
sempre subversivo diante das estruturas de poder.
O cristão será julgado pela maneira como reage diante de Deus que se
identifica com os que tem fome, os migrantes e refugiados, os presos, os
doentes desassistidos (cf. Mt 25,31-46).
Duas atitudes devem ser superadas: apego às riquezas e indiferença aos
pobres. A parábola do rico e de Lázaro (Lc 16, 19-31) é paradigmática para se
pensar outro modelo de economia. A indiferença ao pobre que “morre às portas
dos ricos é pecado que leva à morte” (Lc 16,20).
A alternativa para a indiferença dos ricos está na organização dos
“Lázaros” da sociedade. Jesus, ao partilhar os pães com a multidão que tem
fome, aponta que o Reino está entre nós (Jo 6,1-15).
Participar do banquete da Eucaristia pressupõe um comprometimento com
esse projeto de Jesus: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mc 6,37).
O Verbo se fez carne para que todos tenham vida em abundância (Jo
10,10). Ou afirmamos a vida ou negamos a vida. Este é o horizonte de Jesus.
Os relatos de Atos 2, 44-45 e Atos 4, 32-35 exemplificam que
compartilhar os bens vitais para que não haja indigentes na comunidade cristã é
central na vida cristã.
É preciso sair desta economia baseada na concentração egoísta da
riqueza e que destrói a natureza. Romper com a ditadura do consumismo. Sair do
homo economicus e construir o homo ecologicus que convive em harmonia com a
natureza. Não haverá futuro sem esta conversão.
A economia é um instrumento a serviço da vida. O melhor modelo
econômico é aquele que preserva a dignidade humana, bem comum e o cuidado da
casa comum (Laudato Sí, n. 156).
“Cada dia nos é oferecida uma nova oportunidade, uma etapa nova. Não
devemos esperar tudo daqueles que nos governam. Alimentemos o que é bom, e
coloquemo-nos ao serviço do bem” (Fratelli tutti, n. 77).
Dom Total
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