Amazônia
é palco de atrocidades há seculos Foto (Mauro Pimentel/AFP)
É imprescindível e urgente trazer à luz e estancar o sangue que impregna o verde da maior floresta tropical do mundo
Um romance deve ser
avaliado pela crítica e, sobretudo, pelos leitores. A opinião do autor pouco
importa, até porque todo pai ou mãe julga a feiura do filho a mais bela obra da
Criação. Eu mesmo, como todo leitor, admiro obras de ficção que muitos detestam
e vice-versa.
Devo, no entanto,
dizer uma palavra sobre meu romance “Tom vermelho do verde” que a Rocco lança
neste mês de julho. Ele descreve o genocídio de indígenas amazônicos perpetrado
por militares, agentes da Funai e garimpeiros disfarçados de pastores
evangélicos. Fato real ocorrido em plena ditadura, entre os anos de 1968 e
1977, narrado no livro “Massacre”, de Silvano Sabatini, que teve como copywriter o
jornalista Antônio Carlos Fon, e publicado em 1998.
O livro me impactou
por revelar uma face cruel da ditadura militar pouco conhecida do público: a
repressão aos povos indígenas. Durante 19 anos fiquei “grávido” do tema,
motivado a transformá-lo em romance. Até que em 2017 decidi pôr mãos à obra.
Foram cinco anos de pesquisas, entrevistas, consultas a indigenistas e
leituras, muitas leituras.
Digo isso porque
amigos se surpreendem com a coincidência entre o brutal assassinato de Bruno
Pereira e Dom Phillips e o tema do romance. Houve quem me perguntasse se o
escrevi a partir das truculências cometidas no Vale do Javari...
Impressiona-me, sim, a
linha de continuidade entre o massacre dos Waimiri-Atroari, nas décadas de 1960
e 1970, e a atual omissão da Funai somada à cumplicidade de militares,
policiais e autoridades públicas com o garimpo ilegal e outras atividades
criminosas.
Há séculos o palco das
atrocidades é o mesmo: a Amazônia, alvo da cobiça de brancos que, movidos pela
ânsia de enriquecimento rápido, devastam a floresta e exterminam seus legítimos
guardiães, os povos originários.
Por isso, é importante, imprescindível e urgente trazer à luz e estancar o sangue que impregna o verde da maior floresta tropical do mundo
DomTotal
*Frei Betto é escritor e religioso
dominicano. Recebeu vários prêmios por sua atuação em prol dos direitos humanos
e a favor dos movimentos populares. Foi assessor especial da Presidência da
República entre 2003 e 2004. É autor de "A Obra do Artista – uma visão
holística do Universo", "Um homem chamado Jesus", "Batismo
de Sangue", "A Mosca Azul", entre outros.
Nenhum comentário:
Postar um comentário