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O
cristianismo cresceu como religião proselitista e expansionista
Felipe Magalhães Francisco*
O
verso “Feliz a nação cujo Deus é o Senhor”, do Salmo 33 (v. 12) é
insistentemente repetido por religiosos do espectro neopentecostal. O
cristianismo cresceu como religião proselitista e expansionista. Já no Novo
Testamento temos traços bastante explícitos de como a Boa-Nova do Evangelho
deveria se espalhar por cada canto do mundo. É certo, porém, que no
cristianismo primitivo e, antes, já na pregação de Jesus, isso não significava
pregação proselitista no sentido de formar uma religião, e sim um estilo de
vida.
O
cristianismo foi se institucionalizando, ao longo do tempo, e, tornando-se
efetivamente uma religião, adotou esta postura proselitista e expansionista
contando com o aparato do poder político, desde o Império Romano. Tivemos, na
história do Ocidente, longos séculos sob as forças do que se chamou de
Cristandade, com hegemonia do cristianismo, incluindo na formação da cultura e
das estruturas de pensamento, para além do comportamento. O declínio da
Cristandade, como hegemonia católica, com a Reforma Protestante, inclusive, em
meio à mudança de paradigma com surgimento da Modernidade, anunciou um
recolocar do cristianismo na ordem social (para muitos, essa mudança
significaria, mesmo, o fim do cristianismo).
Séculos
depois, em tempos de pós-cristianismo, a religião cristã não desapareceu.
Transformou-se. O catolicismo continua forte, sobretudo na América Latina, mas
ocupante de outra posição na ordem social e religiosa. O Protestantismo também
se transformou: conheceu movimentos em ondas que provocaram mudanças teológicas
e religiosas. Em nosso país, temos visto o crescimento do movimento
neopentecostal que tem criado nova visão de mundo, sobretudo em meio aos mais
empobrecidos e empobrecidas da sociedade. E é, justamente nestes meios, em que
tem crescido um avanço sobre a política, como verdadeira cooptação da coisa
pública, para um interesse de poder, com fundo proselitista e expansionista. No
catolicismo reacionário, nota-se a mesma coisa.
É
preciso, com urgência democrática, frear esses avanços. A participação de
pessoas religiosas nos muitos processos políticos é desejada e importante. Para
o cristianismo, o envolvimento na busca pelo bem-viver para o conjunto das
pessoas é, inclusive, uma questão ética. A apropriação da coisa pública,
contudo, para o fortalecimento de uma ideologia religiosa, por mais
bem-intencionada que seja, é um risco para a democracia e para o conjunto da
sociedade e uma desvirtuação do espírito da religião. É preciso que refltiamos
sobre isso, e busquemos caminhos para a superação destes arroubos autoritários
de lideranças religiosas que cooptam a coisa pública.
O
Dom Especial desta semana é um chamamento a esta reflexão, sobretudo quando
estamos tão próximos das eleições – as mais importantes desde a
redemocratização – e temos visto como o aparato religioso tem sido suporte para
ideologias que comprometem a democracia, provoca violências e mortes. No
primeiro artigo, O fundamentalismo
religioso e sua problemática no campo político, de Ana Teresa Dantas, provoca-nos à
reflexão sobre a importância de um Estado laico, para a garantia das liberdades
religiosas e a busca pela garantia da dignidade de todos os cidadãos e cidadãs.
Feliciano José Kissua, no artigo A lógica da
exclusão religiosa frente as políticas públicas, faz uma leitura sociológica da
religião, apontando para os riscos de quando ela assume uma postura
exclusivista e de exclusão, com consequências graves para o conjunto da
sociedade. Por fim, no artigo A moral cristã
frente aos excluídos da sociedade, de Robert Henrique Sousa Dantas, faz um chamamento à
questão ética, tão fundamental para o cristianismo, em tempos em que o
moralismo tende a trazer retrocessos para a sociedade.
Boa
leitura!
Dom Total
*Felipe
Magalhães Francisco é teólogo. Articula a Editoria de Religião deste portal. É
autor do livro de poemas Imprevisto (Penalux, 2015). É co-autor de Teologia no
século 21: novos contextos e fronteiras (Saber Criativo, 2020). E-mail:
felipe.mfrancisco.teologia@gmail.com.
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