Desastres ambientais quintuplicaram
nos últimos 50 anos | Pixabay
Mais de 40% da perda da vegetação nativa
mundial aconteceu no Brasil
O
capitalismo ameaça a sobrevivência da humanidade. Agravou a crise climática, a
desigualdade social, o poderio bélico. As estações do ano parecem
enlouquecidas: faz calor em pleno inverno e frio intenso no auge do verão.
Furacões, ciclones e secas são como se Gaia arreganhasse os dentes para morder
a espécie humana que, em busca insaciável de lucro, não cessa de violentá-la.
Os
desastres ambientais quintuplicaram nos últimos 50 anos: desmatamento,
queimadas, contaminação das águas fluviais e marítimas. Esses crimes matam 115
pessoas por dia e dão prejuízo diário de US$ 202 milhões. Em 2021, o planeta
perdeu 11,1 milhões de hectares de florestas tropicais (World Resources
Institute (WRI)/ Universidade de Maryland, EUA). Mais de 40% da perda da vegetação nativa mundial aconteceu no
Brasil. A floresta amazônica, que se estende
por nove países, já perdeu 30% de sua cobertura vegetal devido à pressão dos
exportadores de madeira nobre e do agronegócio dedicado à pecuária e à produção
de soja, exportadas para a Europa e a China.
Comunidades
indígenas e camponesas são afetadas pela mineração predatória. O garimpo ilegal
extrai ouro e diamante utilizando mercúrio, que contamina as águas e a terra.
Em nenhum período anterior da história se utilizaram tantos agrotóxicos, em
detrimento da fertilidade do solo, com extermínio da biodiversidade e
poluição dos rios, lençóis freáticos e a atmosfera.
A
ciência já comprovou que o agrotóxico glifosato – o mais vendido no mundo –
provoca câncer. Mais de 42 mil agricultores estadunidenses ganharam direito à
indenização por terem sido expostos ao glifosato, um poderoso herbicida que
mata ervas daninhas e o que se cultiva, exceto sementes transgênicas.
As
águas dos mares estão cada vez mais poluídas por plásticos e outros dejetos humanos,
que eliminam muitas espécies de peixes e aniquilam a vida marinha. O uso
crescente de fertilizantes químicos provoca a acidificação das águas oceânicas.
No Oceano Pacífico, por exemplo, há uma grande mancha de lixo que se estende
por 1 milhão de quilômetros quadrados.
As
cidades são poluídas pelo dióxido de carbono emitido pela queima de
combustíveis fósseis, que aumenta as doenças respiratórias. E a Covid veio
agravar a crise sanitária da humanidade, pois a destruição da biodiversidade e
a expansão das fronteiras agrícolas pelo agronegócio provocam o aumento de
zoonoses, ou seja, a transmissão de enfermidades de animais para seres humanos.
As
comunidades indígenas e camponesas, que ao longo da história protegeram e
cuidaram da biodiversidade, são vítimas de violências permanentes. O capital
trata de agredi-las para assumir o controle dos territórios protegidos.
A
crise socioambiental, tão denunciada pelo papa Francisco em sua encíclica
“Laudato Sí” (Louvado sejas), afeta a economia, a política e a ética. Bilhões
de pessoas sofrem falta de alimentos, água, moradia, terra, emprego, educação e
renda, e são obrigadas a migrar.
A
quem culpar por colocar a humanidade em risco? O único responsável é o sistema
capitalista movido por sua desenfreada ganância de apropriação privada das
riquezas e crescimento exponencial de lucro. Assim, impede a proteção de nossos
biomas, a redução dos fluxos migratórios e a distribuição de uma renda básica a
todos os 8 bilhões de habitantes da Terra.
A
crescente privatização do Estado nega à humanidade suficientes direitos
trabalhistas e sociais. Fracassa a democracia formal e se ampliam os espaços
dos governos autoritários. O capitalismo inocula nas pessoas, sobretudo
crianças e jovens, forte tendência ao individualismo e ao consumismo. Os
vínculos de solidariedade cedem lugar ao ódio e as diferenças – sexuais,
étnicas, políticas – se tornam intransigentes divergências.
As
mais poderosas corporações transnacionais não respeitam fronteiras, leis,
Estados, governos e direitos dos povos. Empresas como Bayer, BASF, Monsanto,
Syngenta e DuPont fabricam agrotóxicos, exploram a mineração predatória,
multiplicam veículos e sistemas de energia elétrica movidos a combustíveis
fósseis. Coca-Cola, Pepsi e Nestlé controlam o mercado de água e considerável
parcela do mercado mundial de alimentos. Associados, estão os bancos e o
capital financeiro.
Somam-se
a essas empresas e bancos as poderosas corporações de tecnologia que controlam
a opinião pública, como Amazon, Microsoft, Google, Facebook/Meta e Apple.
Por
sua vez, os governos encobrem os crimes corporativos e a grande mídia,
dependente da publicidade desse conglomerado, evita denunciar as violações
cometidas pelas corporações e apontar os culpados.
Diante
de tais ameaças só resta à sociedade civil se fortalecer via movimentos
populares e sociais, grupos identitários e sindicatos, comunidades religiosas e
partidos políticos progressistas. Há que buscar “um outro mundo possível” e
intensificar a educação política, crítica e participativa dos segmentos
excluídos e vulneráveis.
Fora
do povo não há salvação. Nem libertação.
DomTotal
*Frei
Betto é escritor e religioso dominicano. Recebeu vários prêmios por sua atuação
em prol dos direitos humanos e a favor dos movimentos populares. Foi assessor
especial da Presidência da República entre 2003 e 2004. É autor de "A Obra
do Artista - uma visão holística do Universo", "Um homem chamado
Jesus", "Batismo de Sangue", "A Mosca Azul", entre
outros.
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