Papa Francisco durante sua viagem ao Canada em julho de 2022 (Vatican
Media)
"Nota" conjunta dos
Dicastérios para a Cultura e para o Desenvolvimento Humano Integral:
"Muitos cristãos cometeram atos perversos contra os indígenas". As
bulas papais do século XV que concediam aos soberanos colonizadores os bens dos
povos originários são documentos políticos, instrumentalizados para atos
imorais. Já em 1537, Paulo III declarou solenemente que os indígenas não
deveriam ser escravizados nem roubados de suas propriedades.
VATICAN NEWS
Graças à ajuda dos indígenas,
"a Igreja adquiriu uma maior consciência de seus sofrimentos, passados e
presentes, devido à expropriação de suas terras (...) e às políticas de
assimilação forçada, promovidas pelas autoridades governamentais da época, que
visavam eliminar as suas culturas indígenas". É o que se lê na “Nota conjunta sobre a Doutrina da Descoberta” dos Dicastérios
para a Cultura e a Educação e para a Promoção do Desenvolvimento Humano
Integral publicada nesta quinta-feira, 30 de março. O documento afirma que a
"Doutrina da Descoberta", teoria que serviu para justificar a
expropriação dos indígenas pelos soberanos colonizadores, "não faz parte
do ensinamento da Igreja Católica" e que as bulas papais com as quais
foram feitas concessões aos soberanos colonizadores nunca se tornaram
magistério.
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É um texto importante que, oito
meses depois da viagem do Papa Francisco ao Canadá, reitera claramente a
rejeição da Igreja Católica à mentalidade colonizadora. “Ao longo da história”,
recorda-se, “os Papas condenaram os atos de violência, opressão, injustiça
social e escravidão, inclusive os cometidos contra as populações indígenas”. E
“também foram numerosos os exemplos de bispos, sacerdotes, religiosos,
religiosas e leigos que deram a vida em defesa da dignidade daqueles povos”. A
Nota também recorda que “muitos cristãos cometeram atos celerados
contra as populações indígenas, pelos quais pediram perdão em várias
ocasiões os últimos Papas.”.
A propósito da "Doutrina da
Descoberta", afirma-se que "o conceito jurídico de «descoberta» foi
debatido pelas potências coloniais a partir do século XVI e encontrou
particular expressão na jurisprudência dos tribunais de vários países do século
XIX, segundo a qual a descoberta de terras pelos colonos conferia um direito
exclusivo de extinguir, por meio de compra ou conquista, o título ou a posse
destas terras pelas populações indígenas". Segundo alguns estudiosos, esta
"doutrina" encontrou sua base em vários documentos papais, em
particular nas Bulas de Nicolau V "Dum Diversas" (1452) e "Romanus
Pontifex" (1455), e na de Alexandre VI "Inter Caetera" (1493).
Trata-se de atos com os quais estes dois Papas autorizaram os soberanos
portugueses e espanhóis a apoderar-se das propriedades nas terras colonizadas,
subjugando as populações originárias.
A pesquisa histórica demonstra
claramente”, afirma a Nota, “que os documentos papais em questão, escritos em
um período histórico específico e ligados a questões políticas, nunca foram
considerados expressões da fé católica”. Ao mesmo tempo, a Igreja “reconhece
que essas bulas papais não refletiam adequadamente a igual dignidade e direitos
dos povos indígenas”. E acrescenta que “o conteúdo destes documentos foi
manipulado para fins políticos pelas potências coloniais em competição, para
justificar atos imorais contra as populações indígenas, às vezes realizados sem
a oposição das autoridades eclesiásticas”. Portanto, é justo, afirmam os dois
Dicastérios da Santa Sé, “reconhecer esses erros, consciencializar-se dos
efeitos terríveis das políticas de assimilação e o sofrimento vivido pelas
populações indígenas, e pedir perdão”.
Em seguida, citam-se as palavras do
Papa Francisco: “Nunca mais a comunidade cristã poderá deixar-se contagiar pela
ideia de que uma cultura seja superior às outras, ou que seja legítimo recorrer
a meios de coação dos outros”. E recorda-se, "sem meios termos", que
o magistério da Igreja apoia o respeito devido a todo ser humano e que a Igreja
"repudia, portanto, aqueles conceitos que não reconhecem os direitos
humanos intrínsecos dos povos indígenas", inclusive a conhecida
"Doutrina da Descoberta".
Por fim, a Nota menciona as
"numerosas e repetidas" declarações da Igreja e dos Papas em favor
dos direitos dos povos indígenas, começando pela contida na Bula "Sublimis
Deus" de Paulo III (1537), que declarou solenemente que os indígenas não
devem “de forma alguma ser privados de sua liberdade ou da posse dos seus bens,
mesmo que não sejam de fé cristã; e que podem e devem, livre e legitimamente,
gozar da sua liberdade e da posse de seus bens; nem devem ser de forma alguma
escravizados; caso contrário, o ato será nulo e sem qualquer efeito.”
"Mais recentemente, a solidariedade da Igreja com os povos indígenas
suscitou o forte apoio da Santa Sé aos princípios contidos na Declaração das
Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas". A sua implementação
“melhoraria as condições de vida e ajudaria a proteger” os direitos desses
povos.
Fonte: Vatican News
Demorou mais de 500 anos mas chegou este dia. Parabéns pela coragem profética. Antes tarde que nunca .
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