Com
291 trabalhadores resgatados no primeiro trimestre de 2023, o ano já soma quase
metade dos resgates realizados em uma década no Rio Grande do Sul.
De
acordo com o novo informe do Ministério Público do Trabalho (MPT-RS), nesta segunda-feira, 13, sobe de 56 para 85 o número de trabalhadores
resgatados de trabalho escravo na última sexta-feira, 10, em duas estâncias de
arroz localizadas Uruguaiana. 11 são adolescentes com idades entre 14 e 17
anos. Os trabalhadores prestavam serviços
análogos à escravidão para arrozeiros da região proprietários
das fazendas Santa Adelaide e São Joaquim.
A
reportagem é de César Fraga, publicada por Extra Classe, 13-03-2023.
Os
números foram atualizados após análise de casos e coleta de depoimentos
realizada durante o final de semana.
Jovem perdeu os movimentos dos dedos em
acidente
Nos
depoimentos os relatos dão conta de que o grupo era contratado para fazer o
corte do arroz vermelho, gramínea daninha que prolifera junto ao arroz
cultivado e provoca perdas à lavoura.
As
tarefas eram executadas com ferramentas inapropriadas que os próprios
trabalhadores deveriam providenciar. Muitos usavam apenas faca de cozinha.
A aplicação de agrotóxico era feita sem equipamento de proteção individual (EPI).
Pelos
relatos, um dos menores sofreu um acidente com um facão e ficou sem movimentos
de dois dedos do pé.
Veneno sem proteção
Também
fazia parte das atribuições
dos trabalhadores a aplicação de veneno pelo método de “barra
química”, em que dois trabalhadores aplicam o agrotóxico usando uma barra
metálica perfurada conectada a latas do produto – um tipo de atividade que
exige equipamentos individuais de proteção, que não eram fornecidos.
Os
trabalhadores também eram obrigados a caminhar quase uma hora em pleno sol até
chegar ao local de trabalho. As vítimas relataram que recebiam cem reais por
dia, mas a comida e as ferramentas de trabalho eram por conta deles próprios.
Não
havia acesso a água potável nem a refrigeração, e nessas
condições a comida estragava constantemente – levando muitos trabalhadores a
passar o dia sem comer. Se algum deles adoecesse, teria remuneração descontada.
Os depoimentos tomados no fim de semana também falam de venda de drogas durante
os trabalhos.
Pagamentos
Os
empregadores (os proprietários das estâncias Santa Adelaide e São Joaquim) serão notificados para assinar a
carteira de trabalho dos resgatados e pagar as devidas verbas rescisórias.
O MPT vai pleitear depois disso pagamentos
de indenizações por danos morais individuais e coletivos. Os trabalhadores
foram encaminhados de volta a suas casas.
O MPT e a Defensoria Pública da União (DPU) negociaram o pagamento de três parcelas de seguro-desemprego, de verbas
rescisórias, além do devido registro em carteira de trabalho de todos. Esses
valores ainda estão sendo regularizados porque muitos, principalmente entre os
adolescentes, não tinham a devida documentação (CPF e carteira de trabalho) e
nem conta em banco. Houve também questões de detalhamento da identificação
de resgatados com
nomes muito semelhantes.
Todos
eram de municípios da região, em especial Itaqui, São Borja, Alegrete e Uruguaiana, recrutados por um “gato”, um
agenciador de mão de obra que atuava na fronteira oeste do Rio Grande do Sul.
Agenciador foi preso e liberado sob fiança
O
“gato”, homem responsável pelo agenciamento ilícito foi preso em flagrante por
redução à condição
análoga a de escravo (Art. 149 do Código Penal) e conduzido à
Polícia Federal, foi encaminhado ao Sistema Penitenciário e depois liberado sob
fiança.
Recordes de resgates de trabalho escravo no
Estado
Trata-se
do segundo maior resgate de trabalhadores registrado no Estado, atrás apenas
dos 207 encontrados em Bento Gonçalves em fevereiro. Em todo o Rio Grande do Sul, já são até agora 291 resgatados só em 2023, número que se
aproxima do dobro dos 156 resgatados no ano passado – e que por sua vez já
havia representado um recorde.
Os
resgates resultaram de uma operação conjunta realizada pelo Ministério Público do Trabalho, pelo Ministério do Trabalho e Emprego e pela Polícia Federal de Uruguaiana, após uma denúncia informar a presença
dos jovens na propriedade, em trabalho irregular e sem carteira assinada.
O
grupo móvel de fiscalização se dirigiu ao local e encontrou não apenas os
adolescentes, mas trabalhadores adultos em situação análoga à escravidão. Ao
todo, foram 82 os resgatados – 54 deles encontrados na Santa Adelaide e 28 na São Joaquim.
O
MPT-RS foi representado na ação pelos procuradores da unidade de Uruguaiana Franciele
D’Ambros e Hermano Martins Domingues. Com os depoimentos tomados ao
longo do fim de semana, emergiu um quadro mais completo da situação degradante
a que os trabalhadores estavam expostos.
Todos
eram de municípios da região, em especial Itaqui, São Borja, Alegrete e Uruguaiana, recrutados por um “gato”, um
agenciador de mão de obra que atuava na fronteira oeste do Rio Grande do Sul. O homem foi preso em flagrante, levado a um estabelecimento
prisional do Estado e liberado após pagar fiança durante o fim de semana.
Resgatados de trabalho escravo no RS de 2013
a 2023
2023
– 290
2022
– 156
2021
– 76
2020
– 5
2019
– 2
2018
– 0
2017
– 6
2016
– 17
2015
– 32
2014
– 1
2013
– 44
*Dados
da Gerencia Regional do Trabalho – Ministério do Trabalho e Emprego.
Denúncias
Podem
ser feitas de forma remota e sigilosa no Sistema Ipê, sistema lançado em
2020 pela Secretaria de Inspeção do
Trabalho (SIT) em parceria com a Organização Internacional do
Trabalho (OIT).
Em
2022 o Sistema Ipê recebeu 1.654 denúncias (um
aumento de 66% em relação ao ano anterior), sendo que todas as denúncias foram
analisadas pela Divisão de Fiscalização para
Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae/SIT/MTE).
Fonte ihunisinos
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