“E vós, quem
dizeis que eu sou?” (Mt 16,15)
Neste
domingo (13º do Tempo Comum), a liturgia nos convida a “fazer memória” de S. Pedro e S.
Paulo, dois
personagens instigantes, inspiradores e motivadores para todos nós cristãos,
seguidores(as) d’Aquele que continuamente nos desafia com sua pergunta: “E vós, quem
dizeis eu sou?”
Não
se trata de dar uma resposta teológica, mas de reforçar nossa adesão e
identificação à pessoa de Jesus Cristo. Por isso, cada um responde de maneira
diferente, porque não há um seguimento igual para todos.
Foi
assim que, Pedro e Paulo, com suas personalidades tão distintas, deixaram-se
impactar pela pergunta de Jesus e souberam responder com a vida; por isso, eles
são referências para nós.
Há
perguntas inofensivas, fáceis de responder e que não nos comprometem. O
problema está quando nos fazem perguntas nas quais nos sentimos implicados.
Há
perguntas que parecem ser de pesquisas; e há perguntas que nos des-velam por
dentro. Há perguntas secundárias sobre as quais podemos dizer qualquer coisa. E
há perguntas essenciais que nos movem a falar de nós mesmos. E essas perguntas
doem porque são perguntas que desnudam o fundo de nosso coração. São perguntas
que nos implicam naquilo que somos realmente.
O perguntar é ousado, instigante; perguntar contém desafio, provocação;
leva dose de irreverência.
“Perguntar é mergulhar no abismo” (Exupèry). As perguntas têm uma força que não encontramos
nas respostas. Enquanto perguntamos por alguém, palpita em nós um impulso, um
interesse que não se apaga enquanto não sacia nossa curiosidade.
A pergunta é movimento; é a pergunta que faz emergir a novidade,
pois ela ativa a busca por uma resposta criativa. Mais ainda, perguntar põe em crise certas convicções,
ideias fechadas, modos arcaicos de viver...e nos mantém em busca permanente.
É
neste nível que surge a pergunta de Jesus aos discípulos, na região de Cesaréia de Filipe.
Ele
não pergunta aos seus discípulos sobre o que pensam a respeito do Sermão da
Montanha ou sobre sua atuação curativa juntos aos doentes da Galiléia. Para
seguir Jesus, o decisivo é a adesão à sua Pessoa. Por isso quer saber o que
eles pensam e sentem, depois de um tempo de convivência com Ele.
Jesus
propõe a pergunta fundamental, “e vós, quem dizeis que eu sou?”; uma pergunta exigindo que eles
se examinem a sério, que tomem consciência do que pretendem, que explicitem as
reais motivações que os levam a segui-lo. Responder à pergunta “Quem sou eu
para vocês?” é fazê-los comprometer com um novo estilo de vida, é assumir o
novo caminho com Ele, é arriscar-se numa aventura.
A pergunta é desafiadora, e não simples
curiosidade e inquietação, e se dirige a todos. Cada um tem de dar sua
resposta. Ela exige uma tomada de posição, um ato de fé.
Pedro e Paulo responderam com suas vidas a pergunta feita por Jesus;
por isso, eles não são somente duas colunas que sustentam a grande comunidade
cristã; eles representam as duas dimensões essenciais para o dinamismo da
Igreja. A liturgia intuiu que é preciso integrar as identidades destes dois
personagens. Não se pode privilegiar um em detrimento do outro.
Nos
Evangelhos, Pedro é o pescador que, impactado pela presença e pelo convite de
Jesus, vai entrando, aos poucos, em sintonia com Ele. Um encontro que vai
crescendo em adesão à proposta do Reino; um caminho de seguimento que tem seus
momentos de obscuridade e de crise, sobretudo ao ver o fracasso do Mestre
condenado pelas autoridades religiosas e políticas.
Pedro
é o protótipo do cristão que vai se convertendo, abrindo-se à presença
desconcertante de Deus na conduta histórica de Jesus. Em Pentecostes, Pedro
fala em nome dos primeiros discípulos, cuja fé vem a ser normativa para todas
as gerações que se sucedem na história da igreja. Ele confessa o artigo
central e original da fé cristã: “Jesus Cristo é o Filho de Deus vivo”. E se a Igreja se mantém firme
nessa confissão, nada nem ninguém a destruirá.
Entre
os discípulos de Jesus, Pedro foi sem dúvida o mais atirado, o mais impulsivo,
com o perigo que isso implica. Era o líder do grupo, o primeiro a falar em
qualquer circunstância, sem medo de repreender Jesus quando este anuncia sua
paixão, sem medo de levar uma reprimenda quando Jesus quer lavar os pés ou
quando anuncia que todos o trairão. O fato de ser tão lançado o situa também no
lugar mais perigoso, o da negação de Jesus. Mas, ele mesmo termina confessando
depois da ressurreição: “Tu sabes tudo, tu sabes que te amo”. Não é novidade que Jesus o visse como o líder natural
do grupo depois de sua morte e ressurreição.
Paulo, por sua vez, é o homem universal. Alcançado e convertido pela
presença do Ressuscitado, ele abriu a Igreja ao mundo grego e romano, superando
os moldes da religião judaica. Com sua itinerância, rompeu as fronteiras
geográficas, culturais e religiosas, pois, para ele, o Evangelho de Jesus é
anúncio de salvação para todos os povos. O que muitos não conhecem é a
revelação que Deus lhe fez e que ele tanto insiste em suas cartas: que a boa
notícia de Jesus não era só para os judeus, mas também para toda a humanidade.
A
expansão da Igreja primitiva é humanamente inconcebível sem a figura de Paulo.
Percorreu milhares de quilômetros e se expôs a todo tipo de perigos para levar
o anúncio de Jesus “até os confins da terra”.
Em
chave de interioridade podemos afirmar que Pedro e Paulo são também dimensões
de nosso ser. “Pedro” representa a solidez interior, a certeza, a convicção, os
valores... Viver a “dimensão Pedro” é cuidar dos fundamentos de nossa vida, a
rocha sobre a qual construímos a maneira de viver o seguimento de Jesus.
Nossa
própria interioridade é a rocha consistente e firme, bem talhada e preciosa
que temos, para encontrar segurança e caminhar no seguimento superando as
dificuldades e os inevitáveis golpes na luta pela vida. É no “eu mais
profundo”
que as forças vitais se acham disponíveis para nos ajudar a crescer
dia-a-dia, tornando-nos aquilo para o qual fomos chamados a ser. Trata-se da
dimensão mais verdadeira de nós mesmos, a sede das decisões
vitais, o
lugar das riquezas pessoais, do melhor que há em nós, onde se encontram os dinamismos do nosso crescimento, de onde
partem as nossas aspirações e desejos fundamentais, onde percebemos
as dimensões do Absoluto e do Infinito da sua vida.
“Paulo”, por sua vez, nos fala da força expansiva, da saída de
nós mesmos, de abertura às realidades diferentes. Das raízes profundas brotam
as respostas mais criativas e duradouras; a interioridade desvelada ativa a solidariedade e o
compromisso como acesso à realidade para transformá-la, desencadeando um
movimento de profundas mudanças.
Fundamentados
sobre a rocha interior, nossa vida se expande, nos tornamos mais abertos e
sensíveis, capazes de escutar os acontecimentos, alimentar uma atenção
contemplativa frente à realidade que nos cerca, respondendo a seus apelos e
tomando decisões maduras e evangélicas.
Viver
a “dimensão Paulo” é abrir-nos à desafiante realidade, entrando no fluxo da
“Encarnação do Verbo no mundo” e sendo presenças portadoras da Boa-Notícia do
Evangelho.
Como
harmonizar “Pedro e Paulo” em nossa vida, para que nosso seguimento de Jesus
tenha a marca da criatividade?
Inspirados
por eles, nossa vida cristã se centra na identificação com Jesus; afinal, não
somos seguidores de uma religião, doutrina, rito..., mas de uma pessoa. E essa
identificação se expressa como resposta que damos à pergunta feita na região de
Cesaréia de Felipe: “e vós, quem dizeis que eu sou?”.
Texto bíblico: Mt 16,13-20
Na oração: Busque, na oração, cavar mais profundamente, até atingir a rocha de seu ser, o fundamento
original e consistente de sua personalidade.
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Quais são os valores perenes, as visões ousadas, as experiências fundantes, as
opções duradouras... que constituem a rocha inabalável, sobre a qual construir
sua vida? Como ser “presença paulina” no seu contexto social, religioso,
cultural...?
Pe. Adroaldo Palaoro sj.
Fonte: centroloyola.org.br
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